Acredito
que a leitura é uma terapia, principalmente se é a linha que você gosta. Muitos
pensam que apenas os livros de autoajuda servem como terapia, mesmo não
concordando, respeito. Encontrei esse texto do Moacyr Scliar muito
interessante, vale como terapia.
por Moacyr Scliar
A
palavra placebo (do latim agradarei) refere-se a uma substância ou um
procedimento que teoricamente não faria efeito sobre o organismo, mas que acaba
tendo resultados terapêuticos, pela crença que uma pessoa deposita nela.
Pergunta: é o texto um placebo? No caso da ficção, pode-se dizer que sim. É
algo que resulta da imaginação de um escritor, de um cineasta, de um
dramaturgo; mas, quando agrada o espectador ou o leitor (um objetivo implícito
na própria criação ficcional), exerce um efeito que poderíamos chamar de
terapêutico. A ficção ajuda a viver. E isso inclui uma melhora da saúde – pelo
menos do ponto de vista psicológico. Para muitas pessoas a leitura é um amparo,
um consolo, uma terapia. Daí nasceu inclusive um gênero de livros que se tornou
popular: as obras de autoajuda. Diferentemente da ficção, elas aconselham o
leitor acerca de problemas específicos: luto, controle do stress, divórcio,
depressão, ansiedade, relaxamento, autoestima, e até a felicidade. Esse tipo de
leitura faz um enorme sucesso; não há livraria que não tenha uma seção
destinada especialmente à autoajuda.
Um
dos autores mais conhecidos dessa área é o médico hindu Deepak Chopra. Formado
em medicina pela Universidade de Nova Déli, na Índia, emigrou para os Estados
Unidos, especializou-se em endocrinologia e trabalhou no New England Memorial
Hospital, em Massachusetts. Uma carreira médica habitual, portanto, que mudou
em 1985, quando Chopra fundou a Associação Americana de Medicina Védica. Em
1993, mudou-se para San Diego, na Califórnia, onde fundou o The Chopra Center
For Well Being. Ainda no mesmo estado, agora em La Jolla, criou em 1996 o
Chopra Center. Fazendo um parênteses: a Califórnia é um conhecido reduto da
vida e da medicina alternativas, como aromaterapia, osteopatia, toque
terapêutico, terapia floral e outras.
Deepak Chopra é autor de mais de 50
livros de autoajuda, que, traduzidos em 35 idiomas, fizeram enorme sucesso; em
1999, a revista americana Time incluiu-o na sua lista das 100 personalidades do
século, como o “poeta e profeta das terapias alternativas”. As obras mostram a
diversidade de áreas que Chopra aborda: ele fala de religião e misticismo
(budismo, cristianismo, cabala), dá conselhos a pais, aborda o envelhecimento,
aconselha sobre guerra e paz, fornece “sete leis espirituais” para o sucesso, e
publicou dois romances, em 1999, Lords of light (Senhores da luz), e em 2000,
The angelis near (O anjo está perto). Também fundou, com seu filho, Gotham
Chopra, uma editora de revistas em quadrinhos e criou, junto com dois
colaboradores, um tarô cabalístico composto de 22 cartas, cada uma das quais
representa a história de um personagem do Antigo Testamento.
Não faltam críticos
para a medicina alternativa. O argumento principal é de que a medicina moderna
deve se basear em evidências resultantes de estudos experimentais,
epidemiológicos, estatísticos, o que não acontece com muitos dos métodos
alternativos. Isto não quer dizer que esse tipo de tratamento não funcione, ou
que a literatura de autoajuda não surta efeito. Neste último caso, o que temos
é um apelo espiritual ou psicológico traduzido na palavra escrita, que, ao
longo do tempo, sempre teve uma aura de autoridade e de verdade. Não por acaso
as três grandes religiões monoteístas, o judaísmo, o cristianismo e o
islamismo, baseiam-se em textos: o Antigo Testamento, o Novo Testamento, o
Corão. Os muçulmanos, aliás, falam nos “povos do livro”. Por outro lado, a própria
medicina tem uma longa tradição de obras escritas para o público em geral.
Aquele que foi, talvez, o pioneiro de todos eles, o Regimen Sanitatis
Salernitanum (Regime de Saúde da Escola de Salerno) – uma das primeiras escolas
médicas do Ocidente – datada do século XII ou XIII, e dá conselhos em versos,
para facilitar a leitura e a memorização. Creia-se ou não na autoajuda, ela
encerra uma lição, que vale para a medicina científica: o paciente precisa do
amparo das palavras. Se não encontrar um médico com quem possa falar, recorrerá
aos livros de autoajuda. E isso é um problema porque, como se sabe – e
diferentemente de nosso organismo – o papel aceita tudo.
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